Sonhar acordado é um combustível para movimentar a vida. Com o objetivo de mostrar o modo como as diferentes gerações cultivam seus desejos, o Instituto Think Olga, organização que propõe soluções para as desigualdades de gênero, fez uma pesquisa sobre os principais sonhos da mulher brasileira em parceria com o projeto “Sonhe como uma garota”.
Uma das conclusões foi que mulheres de todas as idades e de todas as classes socioeconômicas compartilham um mesmo desejo principal: viajar. Para o levantamento foram entrevistadas, de forma online, 1.080 mulheres brasileiras de diferentes faixas etárias e classes sociais, de todas as regiões do país.
Outros sonhos manifestados pelas mulheres são o de conquistar estabilidade financeira, estudar e construir uma carreira.
Diretora da organização, Maíra Liguori, tem algumas hipóteses sobre o que seria o motor desse ímpeto maior de conhecer o mundo.
“Conversamos com a Adriana Pereira, psicanalista especialista em sonhos, e chegamos à conclusão de que a viagem concretiza muitas coisas”, afirma. A primeira delas é o escapismo, ou seja, a possibilidade de se libertar das amarras e das obrigações de ser quem se é no dia a dia para se expressar em um contexto diferente.
“Quem sou eu quando não estou sobrecarregada com o meu contexto?”, diz Liguori. “Às vezes é inclusive um modo de ser ainda mais fiel aos seus verdadeiros desejos.”
Foi pela chance de unir viagem e carreira que Rosana Barbosa, até então administradora, decidiu recalcular a rota e entrar na faculdade de turismo aos 53 anos. Hoje, aos 58, ela reúne grupos de mulheres que desejam ter essas mesmas experiências de imersão em outras realidades.
“Eu adoro pessoas, e o que eu mais gosto em viagens é de estar com outras culturas. É a experiência, a liberdade, as vivências”, afirma.
Um ponto de virada em sua vida, ela diz, aconteceu quando viajou pelo mundo com uma plataforma de turismo voluntário, por meio da qual trocava trabalho por hospedagem, por exemplo.
Rosana avalia que as mulheres que a procuram são motivadas principalmente pelo sentimento de independência e empoderamento que viajar traz.
“É sair do medo e ir atrás da coragem. Muitas mulheres se sentiam presas e achavam que não podiam realizar esse sonho. A viagem te deixa destemida.” Para ela, viajar também traz autoconhecimento. “Dificilmente alguém volta [de uma viagem] com os mesmos sentimentos e pensamentos.”
O desejo das mulheres por liberdade e autonomia é perceptível no mercado de viagens no Brasil, e agências de turismo especializadas em mulheres ainda são importantes e têm seu espaço porque, embora as sociedades tenham avançado, as barreiras de gênero ainda existem.
“Viajar, para um homem, é muito diferente do que viajar é para uma mulher. Um homem nunca se pergunta se o lugar para o qual está indo é seguro, quais roupas ele pode usar”, afirma Dandara Degon, fundadora da agência Woman Trip, especializada em viagens para mulheres. “E a viagem em grupo tem um impacto social de ocupação dos lugares por mulheres”, acrescenta.
Letticia Gerhardt, fundadora da ViajaGuria, afirma que a agência atende mulheres em diversos momentos da vida e com sede de aproveitar a vida ao máximo.
“Chegam mulheres que estão saindo de um relacionamento e querem se redescobrir, mulheres que têm ansiedade social e querem estar em grupo”, conta. Ela diz que fundou a agência com base na paixão por viajar que nutre desde pequena e vê no projeto a realização de um sonho de infância.
Concretizar um sonho, contudo, muitas vezes também requer enfrentar as dificuldades impostas pela vida. Ter dinheiro é o segundo maior sonho das brasileiras, e com frequência uma barreira para a realização do sonho de viajar. “A realidade dura da escassez atropela demais os sonhos”, diz Liguori, do Think Olga.
Bater de frente com os obstáculos da vida real pode ser frustrante e coloca as necessidades básicas no lugar do sonho, fazendo com que os desejos de fato pareçam cada vez mais distantes. “Quando as mulheres falam da viagem, do dinheiro, da carreira e da família, elas estão falando de liberdade”, conclui